2012/04/27

Voluntariado...



"É fundamental que as entidades resistam à tentação de utilizar os voluntários como mão de obra barata, de modo a não desvalorizarem os profissionais, agravando os números do desemprego."





Numa altura em que tanto se fala e recorre ao voluntariado, descobrimos o texto que agora compartilhamos - publicado em Abril no espaço da Internet da revista “FocusSocial” - que aponta algumas questões interessantes a ter em conta no desenvolvimento deste conceito.

Voluntariado - Um Instrumento de Coesão Social
*Paula Guimarães (Jurista e responsável da Fundação Montepio - 17 Abril, 2012)

Ainda no rescaldo do Ano Europeu do Voluntariado e em expectativa relativamente ao anunciado Plano de Voluntariado e às eventuais alterações à Lei em vigor, importa reflectir sobre o papel que esta expressão espontânea da sociedade civil, pode ter na sociedade portuguesa.
Durante o ano de 2011 e mercê de um notável esforço de divulgação e formação, o voluntariado ganhou uma nova dimensão e tornou-se um conceito incontornável, não apenas no contexto das organizações de economia social, mas também no meio empresarial e até nas estruturas da Administração Pública.
Parece claro que o voluntariado constitui uma forma empenhada de exercer a cidadania e que a sua expansão permite estimular a participação cívica, alargar horizontes de solidariedade e fomentar a assunção de responsabilidades e o associativismo.
Cada vez mais heterogéneo, é a manifestação organizada de um sentido de pertença, que nem sempre esteve presente na sociedade portuguesa e que perspectiva uma nova atitude dos cidadãos perante os desafios colectivos da inclusão e da sustentabilidade.
A actividade perene do voluntariado e mesmo uma incursão pontual, desenvolvem competências pessoais indispensáveis aos tempos difíceis que atravessamos, pois trabalham os valores, treinam a cooperação, reduzem os protagonismos individuais e ensaiam a rentabilização de recursos.
Trata-se de uma experiência realizada sob a égide da gratuitidade mas profundamente gratificante, que explora o filão das aptidões próprias, muitas vezes escondidas, sem esperar retribuição ou reconhecimento.
Nesta medida e, quando correctamente implementado, assume-se como um poderoso instrumento de coesão social, um cimento de partilha sinalagmática.
Mas esta visão optimista, não nos deve iludir, nem distrair dos riscos evidentes que o fenómeno enfrenta e que a actual conjuntura de adversidade e de desemprego pode sublinhar.
O primeiro risco consiste no desvirtuamento do voluntariado por parte das organizações promotoras, ávidas de novos recursos humanos e de novas competências e sem recursos para suportar a sua contratação.
É fundamental que as entidades resistam à tentação de utilizar os voluntários como mão de obra barata, de modo a não desvalorizarem os profissionais, agravando os números do desemprego.
Por outro lado, é fundamental distinguir a experiência do voluntariado jovem no âmbito da vivência escolar e de enriquecimento curricular, da realização de voluntariado nas áreas de formação de base, como trampolim para a entrada no mercado de trabalho.
Outro risco consiste no entendimento de que o voluntariado constituiu uma boa terapia pessoal ou uma acção inovadora de "time building" para empresas. O voluntariado é uma actividade em prol dos outros e ainda que deva trazer satisfação a quem o exerce, essa não é a motivação prioritária.
Por fim, mas não menos relevante, o voluntariado não deve ser entendido como uma panaceia ou um instrumento de combate à exclusão, alternativo à intervenção profissional, empoderadora e assente numa lógica de contrato social.
A sua natureza e o seu poder resultam de ser, essencialmente, um complemento da acção pública, que a enriquece, mas não a substitui.
As fronteiras são difusas e perigosas, mas a autenticidade do voluntariado depende da definição clara de fronteiras e da afirmação permanente e convicta dos princípios que o devem inspirar.
Neste sentido, importa consolidar o conceito, definir, com maior rigor os limites de intervenção, determinar o estatuto do voluntário no contexto das organizações promotoras e apostar, com assertividade na formação.



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