2013/08/28

O enigma...




Direitos Humanos

 
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2013/08/25

Lula...

... da Silva é o autor.
Interessante e merece ficar registado.
Mais já têm dito o mesmo, mas nunca é demais repetir.

A hora da acção política


A lenta retoma da economia global e os seus enormes custos sociais, especialmente nos países desenvolvidos, exigem uma corajosa mudança de atitude. É preciso identificar com clareza a raiz da crise de 2008, que em muitos aspectos se prolonga até hoje, para que os líderes políticos e os órgãos multilaterais façam o que deve ser feito para a superar.
A verdade é que no dia 15 de Setembro de 2008, quando o banco Lehman Brothers pediu concordata, o mundo não se viu apenas mergulhado na maior crise financeira desde a quebra da Bolsa de Nova Iorque em 1929. Viu-se também diante da crise de um paradigma.
Outros grandes bancos especuladores nos Estados Unidos e na Europa só não tiveram o mesmo destino porque foram socorridos com gigantescas injecções de dinheiro público. Ficou evidente que a crise não era localizada mas sistémica. O fracasso não era somente desta ou daquela instituição financeira, mas do próprio modelo económico (e político) predominante nas décadas recentes. Um modelo baseado na ideia insensata de que o mercado não precisa de estar subordinado a regras, de que qualquer fiscalização o prejudica e de que os governos não têm nenhum papel na economia a não ser quando o mercado entra em crise.
Segundo este paradigma, os governos deveriam transferir a sua autoridade democrática, oriunda do voto - ou seja, a sua responsabilidade moral e política perante os cidadãos -, a técnicos e a organismos cujo principal objectivo era facilitar o livre-trânsito dos capitais especulativos.
Cinco anos de crise, com gravíssimo impacto económico e sofrimento popular, não bastaram para que esse modelo fosse repensado. Infelizmente, muitos países ainda não conseguiram romper com os dogmas que levaram ao descolamento entre a economia real e o dinheiro fictício, e ao círculo vicioso do baixo crescimento combinado com alto desemprego e concentração de renda nas mãos de poucos. O mercado financeiro expandiu-se de modo vertiginoso sem a simultânea sustentação do crescimento das actividades produtivas. Entre 1980 e 2006, o PIB mundial cresceu 314%, enquanto a riqueza financeira aumentou 1291%, segundo dados do McKinseys Global Institute e do FMI. Isso, sem incluir os derivativos. E, de acordo com o Banco Mundial, no mesmo período, para um total de 200 triliões de dólares em activos financeiros não derivados, existiam 674 triliões de dólares em derivativos.
Todos sabemos que os períodos de maior progresso económico, social e político dos países ricos durante o século XX não têm nada que ver com a omissão do Estado nem com a atrofia da política.
A decisão política de Franklin Roosevelt de intervir fortemente na economia norte-americana devastada pela crise de 1929 recuperou o país justamente por meio da regulação financeira, do investimento produtivo, da criação de empregos e do consumo interno. O Plano Marshall, financiado pelo governo norte-americano na Europa, além da sua motivação geopolítica, foi o reconhecimento de que os EUA não eram uma ilha e não poderiam prosperar de modo consistente num mundo empobrecido. Por mais de trinta anos, tanto na Europa como nos Estados Unidos, o welfare state foi não apenas o resultado do desenvolvimento mas também o seu motor.
Nas últimas décadas, porém, o extremismo neoliberal provocou um forte retrocesso. Basta dizer que, de 2002 a 2007, 65% do aumento de renda dos EUA foram absorvidos por 1% dos mais ricos. Em quase todos os países desenvolvidos há um crescente número de pobres. A Europa já atingiu taxas de desemprego de 12,1% e os EUA, no seu pior momento, de mais de 10%.
O brutal ajuste imposto à maioria dos países europeus - que já foi chamado de austericídio - retarda desnecessariamente a solução da crise. O continente vai precisar de um crescimento vigoroso para recuperar as dramáticas perdas dos últimos cinco anos. Alguns países da região parecem estar saindo da recessão, mas a retoma será muito mais lenta e dolorosa se forem mantidas as actuais políticas contracionistas. Além de sacrificar a população europeia, esse caminho prejudica inclusive as economias que souberam resistir criativamente ao crack de 2008, como os EUA, os BRICS e grande parte dos países em desenvolvimento.
O mundo não precisa e não deve continuar esse rumo, que tem um grande custo humano e risco político. A redução drástica de direitos trabalhistas e sociais, o arrocho salarial e os elevados níveis de desemprego criam um ambiente perigosamente instável em sociedades democráticas.
Está na hora de resgatar o papel da política na condução da economia global. Insistir no paradigma económico fracassado também é uma opção política, a de transferir a conta da especulação para os pobres, para os trabalhadores e para a classe média.
A crise actual pode ter uma saída economicamente mais rápida e socialmente mais justa. Mas isso exige dos líderes políticos a mesma audácia e visão de futuro que prevaleceu na década de 1930 no New Deal, após a II Guerra Mundial. É importante que os EUA de Obama e o Japão de Shinzo Abe estejam adoptando medidas heterodoxas de estímulo ao crescimento. Também é importante que muitos países em desenvolvimento tenham investido, e sigam investindo, na distribuição de renda como estratégia de avanço económico, apostando na inclusão social e na ampliação do mercado interno. O aumento de renda das classes populares e a expansão responsável do crédito mantiveram empregos e neutralizaram parte dos efeitos da crise internacional no Brasil e na América Latina. Investimentos públicos na modernização da infraestrutura também foram fundamentais para manter as economias aquecidas.
Mas para promover o crescimento sustentado da economia mundial isso não é suficiente. É preciso ir além. Necessitamos hoje de um verdadeiro pacto global pelo desenvolvimento e de acções coordenadas nesse sentido que envolvam o conjunto dos países, inclusive os da Europa.
Políticas articuladas em escala mundial que incrementem o investimento público e privado, o combate à pobreza e à desigualdade e a geração de empregos podem acelerar a retoma do crescimento, fazendo a roda da economia mundial girar mais rapidamente.
Elas podem garantir não só o crescimento mas também bons resultados fiscais, pois a aceleração do crescimento leva à redução do défice público no médio prazo. Para isso é imprescindível a coordenação entre as principais economias do mundo, com iniciativas mais ousadas do G20. Todos os países serão beneficiados com essa atuação conjunta, aumentando a corrente de comércio internacional e evitando recaídas protecionistas.
A economia do mundo tem uma larga avenida de crescimento a ser explorada: de um lado pela inclusão de milhões de pessoas na economia formal e no mercado de consumo - na Ásia, na África e na América Latina - e de outro com a recuperação do poder aquisitivo e das condições de vida dos trabalhadores e da classe média nos países desenvolvidos. Isso pode constituir uma fonte de expansão para a produção e para o investimento mundial por muitas décadas. 
Luís Inácio Lula da Silva - Exclusivo Diário de Notícias/The New York Times